segunda-feira, 7 de abril de 2014

"O Pintor da Vida Moderna", de Charles Baudelaire

O pintor da vida moderna, de Charles Baudelaire, é uma obra do século XIX. Esta obra é um ensaio, sendo que em toda a sua extensão são expostas ideias, críticas e reflexões acerca do trinómio modernidade, arte e beleza, através da descrição de elementos que o constituem.
Baudelaire começa por apresentar uma crítica generalizada à arrogância dos que se acham eruditos por consumirem a cultura popular de massas, desprezando os artistas menores. Enaltece, assim, aqueles que conseguem reconhecer a beleza também nos menores artistas, nos que facilmente passariam despercebidos à sombra dos grandes.
O autor faz uma importante reflexão sobre a moda, que poderia servir de cânone cultural a todas as épocas. Reconhece na moda a ideia que o Homem tem de beleza e relação que com ela estabelece, para além de refletir o pensamento filosófico da época. Assim, enaltece o interesse cultural da moda, ao invés do preconceito geral de que a moda é algo superficial. Apesar de reconhecer a história como um componente essencial da arte (e da moda), condena a utilização de modelos antigos como direção principal, introduzindo uma excecional caraterização da beleza, reconhecendo-lhe um elemento eterno e um circunstancial. Para Baudelaire, o elemento eterno relaciona-se, precisamente, com a história, com a capacidade de olhar para trás e aprender e revolucionar sem necessariamente destoar. O elemento circunstancial relaciona-se com a paixão e especificidade da época. Sem este elemento, a arte seria intrinsecamente insípida (nada mais senão a repetição fatigante do já existencial, daí o apelo à originalidade).
Como centro da compreensão desta obra, destaco o conceito de flâneur, em O Pintor da Vida Moderna. Este termo francês, que poderá ser traduzido como errante, o que vagueia sem destino, é essencial para distinguir o mero artista, que será limitado e mundano, do homem do mundo, que é livre. O errante é aquele que se sente em casa fora de casa; o que vê o mundo e está no centro do mundo, mas dele se esconde, nele passa despercebido; aquele que reconhece no mundo a sua família; o que tem um espírito independente, apaixonado, destemido. O errante contempla a vida e só depois tenta encontrar uma forma de a expressar. Somos todos, no fundo, errantes. O que nos deveria distinguir dos meros é o propósito; devemos, sim, vaguear mas não arbitrariamente. Devemos observar, não olhar; escutar, não ouvir; sentir, tocar, contactar. É tudo o que levamos da vida.

Na obra, é ainda introduzida importância da criança, ou pelo menos da sua forma de pensar; para a criança tudo é novidade, nada está desgastado. A utopia era vivermos desta forma, sermos errantes mas com a mente da criança. Somos nós, desta forma, errantes aplicados, que temos a função de procurar expressar e construir a modernidade no detalhe, extrair o eterno da circunstância, e daí extrair a beleza da época. É assim que se constrói a modernidade, modernidade esta não eterna, não algo que perdura, mas algo fugaz e circunstancial que será no futuro, inevitavelmente, passado. Cada modernidade que temos o prazer de experienciar é uma e uma só, é bela pelos detalhes, pelas partes talvez não propriamente transcendentais mas que a distinguem. Esta beleza não está, necessariamente, associada ao que é bonito. É um diamante em bruto, não polido, e é desta forma suja e agressiva que a devemos sentir. Ela será polida por uns, e dessa forma consumida por outros, mas só aquelas que pelo tempo foram erodidos é que a sabem, a compreendem.